terça-feira, 5 de maio de 2015

O que ainda pesa

Penso cada vez menos em você. Aos poucos, as lembranças boas vão desfilando pelos meus pensamentos e seguindo em fluxo para um lugar que não alcanço. Mas uma delas se esconde e tenta passar despercebida, se agarrando às paredes da minha memória. Só hoje a notei. Só hoje lembrei do que eu mais gostava em você.

Talvez tenha sido isso que tenha feito eu me abrir tanto pra você. Teu peso. Um momento de felicidade e desamparo que eu só consigo resumir nessa sensação absurda do teu peso.

Não sei descrever tudo que se passava antes ou durante. Mas um pouco antes, eu já sabia. Você não ia mais aguentar. Ia perder a força que te mantinha suspenso sobre mim. E ia desabar. E então eu sentiria: o peso do teu corpo. Teu estremecer. E não conseguiria esconder o meu sorriso.

[Talvez não fosse o só teu peso. Talvez fosse uma consciência de mim que eu acabava por experimentar. Quando a gravidade te empurrava contra mim, finalmente sentia essas barreiras que me separavam do mundo. Sabia o que era eu, pequena e comprimida, e sabia o que era o mundo, aquele apê e os barulhos por trás da janela. Mas, principalmente, sabia o que proporcionava aquele encontro entre o mundo e eu: você. Nunca soube se você era mais mundo, matéria compressora, ou se ao me comprimir eu também te comprimia e você experimentava essa loucura de se confundir e se perceber.]

Se eu soubesse como acabaria, teria pedido para repetirmos mais vezes. Para te ver desabar mais uma, duas, três, n vezes. Para voltar para aquele momento em que só escuto tua respiração arfante, só sinto o teu peso me contornar, tudo se acalma...

E o tempo para.
Foto: Barbara Carneiro

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