segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Implicante

Naquele dia, levantei quase 14h. E, enquanto decidia se encarava preparar um almoço ou se me vestia para ir à padaria, peguei o celular. Mensagem nova no Facebook. Era você dizendo que tinha ido com a minha cara. Uma piadinha na sequência. Não lembro se ri ou revirei os olhos. Acho que ambos.

Tenho que confessar que falar de você não é tão difícil se eu pudesse falar genericamente. Se não precisasse voltar àquele dia da primeira mensagem e da semana seguinte. Tenho medo de recordar demais. De, no fim das contas, ter algumas certezas. Afinal, está tudo salvo nos bancos de dados das minhas redes e nos backups que fiz para fingir que apagava para sempre quando só tirava do alcance do olhar.

O medo de recordar é o de descobrir que não foi nada demais. Não foi? Talvez sempre comece assim. Um dos dois manda uma mensagem inesperada ou engraçada. Preciso te contar a minha teoria sobre a Rihanna. E o outro dá de ombros antes de decidir embarcar. Nossa, você acordou antes das 9h?
- Às vezes eu acho que sou muito legal com os caras que vêm falar comigo - falei para a Fernanda pensando na forma que tinha encontrado para adiar um encontro sem te deixar triste. (Chequei o meu horóscopo mensal e, aparentemente, o próximo fim de semana é o mais propício para um encontro)
- Amiga, desculpa, mas às vezes a gente só tá sendo babaca mesmo - ela respondeu entre um gole de café e outro.
- Cê acha?

Vou checando o celular a cada cinco minutos a caminho da padaria. Respondo suas mensagens me divertindo. O Pedro ainda me chama de gostosa na minha cabeça e eu começo a te imaginar do outro lado escrevendo as mensagens que meu Facebook notifica. Crio imagens suas se esforçando para manter a conversa e alcançar o equilíbrio certo entre o interesse e a brincadeira. E, talvez eu nem precise admitir isso para você, sinto que domino a situação. Possivelmente por isso, não tenho medo de falar. Vou escrevendo o que vem à minha cabeça. A pior coisa que pode acontecer é ele cair fora. Penso e constato que não me importo com isso. Ainda. 

Você escreve e eu respondo fazendo pouco caso. Escolho meu almoço. Vou querer essa salada. Quando o garçom se aproxima, aponto para o nome no cardápio. Minha salada tem nome: Implicante. Rio e te conto em mensagem. Você também ri. Diz que achou apropriado. Te passo o número do celular para não ter que abrir o navegador toda vez que quero checar se você já respondeu. Você manda uma nova mensagem, agora pelo WhatsApp. É mais direto. Tá disponível hoje?

Dessa parte eu lembro. Fiquei incomodada com a mensagem. Você exibia em alguma entrelinha que achava que o jogo estava ganho. Ou isso ou só arriscou. Nem pensei em levar teu convite em consideração: ressaca, Pedro, menstruação, preguiça. É, eu tinha meus motivos. Mas não quis recusar de cara.

Só se for pra correr no Minhocão
Corro até 10k
uhhh
10k eu não aguento
Meu máximo foi 6k


Entro em casa com cuidado para não acordar ninguém com o barulho do salto. Tem uma caixa em cima da cadeira do meu quarto. Acho estranho, mas acabo deduzindo que o porteiro só deve ter lembrado de entregar depois que eu saí naquela noite. Na caixa de papelão, identifico uma marca esportiva. Finalmente havia chegado a minha encomenda. Um protetor para guardar meu celular e minha chave durante a corrida. Desbloqueio a tela do celular. São mais de 4h da manhã. Olho pra encomenda, penso em te mandar uma mensagem contando. Alguma coisa me diz que é melhor não. É o primeiro fim de semana que não te vejo desde aquela primeira mensagem. Sinto saudades.
Ilustração: Jenny Yu

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